AS BRUXAS FAZEM PARTE DA CULTURA IBÉRICA
O PADRE PROTECTOR DAS BRUXAS
É UMA DAS FIGURAS MAIS CONHECIDAS EM PORTUGAL
E DAS MAIS PRESTIGIADAS DE TODOS OS TEMPOS DA
REGIÃO DO BARROSO.
As “bruxas” e “bruxos” são pessoas de quem o povo diz terem pacto com o diabo, que adivinham o futuro e praticam artes misteriosas. Que podem fazer bruxarias, maldades por encomenda a quem eles quiserem, sobretudo a nível da saúde mental, e que os homens se envolvam com amantes e ponham os”palitos”ás suas mulheres, fabricando verdadeiras guerras familiares.
O Padre, Dr.º António Lourenço Fontes, é um especialista em psicologia popular, porque veio do povo, sempre viveu no meio dele, como “Cura da Aldeia”, e sempre exerceu as funções de psicólogo, pela sabedoria e, sobretudo, porque as pessoas acreditavam nos seus poderes divinos.
Conhecemo-lo bem desde criança, a partir do Barroso mais profundo e angustiante, em diferentes etapas da vida, desde as mais incógnitas até à projecção que lhe foi dada a partir dos estúdios da Radiotelevisão Portuguesa, no Lumiar e na Avenida 5 de Outubro em Lisboa, aonde o acompanhámos.
-Era ele um jovem mal penteado, desgravatado, a falar à parola, lá à maneira das origens, mas era esse mesmo rapaz talentoso e culto que se ia sentar à frente de uma jovem elegante para falar com ele sobre Deus e os Diabos e que influência tinham Eles na vida dos humanos enclausurados lá nas montanhas, de onde viam o sol, o brilho das estrelas e pouco mais.
O Cura da aldeia que a entrevistadora tinha ali à sua frente não era o habitual parolo que só sabia acenar com a cabeça quando lia o breviário, nem o ignorante de quem o povo dizia que o «cura da aldeia quer-se cante e que leia», e quanto ao resto, basta receber os alqueires de centeio. Pois é verdade, o desajeitado Padre Fontes, uma espécie de capelão dos bruxos, das aldeias e das cidades, começou a responder e a intervir com tal franqueza, humanismo e sabedoria que deixou todos os telespectadores admirados, excepto alguns médicos que viam ali concorrência desleal, por defender as medicinas alternativas; e também escandalizava alguns psicólogos, por considerar muitos destes, os bruxos da era moderna, pela similitude de argumentos junto dos doentes.
Mas diz a sabedoria popular: a verdade é como o azeite, posto na água, vem sempre ao de cima. E o cura da longínqua aldeia, logo à primeira vez saltou muito alto. E depois de dar esse salto, a populaça nunca mais o deixou parar nem cair. Sucederam-se entrevistas televisivas para Portugal e para o estrangeiro. Toda a gente começou a falar que o Padre tinha pauta com Deus e com o Diabo e que ele podia fazer bem a muita gente, sobretudo aos possessos do demónio e acalmar os espíritos malignos que andam pelo Mundo para atentar as almas.
Os admiradores e influentes Herman José, Carlos Cruz, Raul Solnado, Fialho Gouveia e outros profissionais da Televisão nunca mais o largaram.
Arrastados por esta corrente da Teologia Moderna ou pela força do “mafarrico”, chegaram emissários de todas as partes do Mundo. Uns para fazerem filmes culturais, ou com objectivos económicos, outros para estudarem estes fenómenos de massas ignorantes como estas; fosse por que fosse, durante décadas, -ou pela magia do bruxedo ou pela confiança nas “medicinas alternativas” todos os caminhos vieram dar a Vilar de Perdizes, Barroso, a terra das casas de colmo, cobertas de neve ou de geada, pessoas com a pele seca pelo fumo e calor das lareiras, vestidas com a lã das ovelhas e cobertas de capuchas, croças e de socos tapados nos pés. Este parecia e era um mundo à parte. Aos serões entretinham-se a contar histórias de bruxas que roubavam os maridos às mulheres, que tolhiam os gados e que para que nada de mal acontecesse, todos tinham de rezar pelas almas dos mortos e dos vivos. A maior parte da população vivia em escravidão psicológica total. Quando descobriram que o Senhor Abade Lourenço Fontes tinha poderes sobrenaturais, nunca mais o largaram, e este foi ouvindo e rezando, umas vezes com vontade e outras vezes sem ela. A caridade cristã assim lho exigia.
- Reparem que, ainda hoje, na Telenovela daTVI,22-06-2009, “Deixa Que Te Leve”, se manda chamar o Prior para curar a Márcia que deve estar possuída pelo “barbudo”=”diabo” «Ela está mesmo possuída do demónio».
Demos agora um salto na história. Outros dirão mais e melhor.
O Povo de Barroso foi, no entanto, o melhor Professor do Padre Fontes. Ensinou-lhe a História milenar de gerações que foram passando o testemunho cultural de umas às outras, oralmente, com a mesma alegria com que as crianças vão passando os brinquedos de mão em mão. Só que, à medida que essas histórias lhe iam chegando, o seu confidente foi-as registando em livros e espalhado aos sete ventos pelos mais sofisticados meios de comunicação social, estando muito desse valioso património, agora guardado no Ecomuseu de Barroso e nas Bibliotecas Nacionais e Municipais.
Penso que todos os bons Barrosões vão ficar satisfeitos com um testemunho que recolhi directamente em Lisboa, de uma personagem que percorreu as Serras do Barroso a fazer programas de televisão mais do que uma vez: «O Padre Fontes tem lá na Região quem tenha ciúmes dele… Mas se um dia lhe tiram o Padre de lá, não fica lá ninguém que lhe chegue aos calcanhares… Vale tanto ele como os outros todos juntos, com quem contactámos.» Dito há anos. (J.A.C.), meu ex-aluno.
Ao confidenciar isto, não quero nenhuma caça às bruxas, quero, sim, com mais ênfase, render a minha homenagem a todo o Executivo da Câmara Municipal, Assembleia Municipal e a todas Entidades e amigos que se uniram para construir, em conjunto, um monumento cultural, a um Homem simples do Povo, de onde saiu anónimo e sempre solidário com ele, nos bons e nos maus momentos que a vida a todos nos reserva.
Os Barrosões sempre foram grandes e orgulhosos da sua História, mas esta, ainda fica mais alta e gloriosa elevando, deste modo, um dos seus filhos mais ilustres, exactamente, enquanto vivo e activo.
Artur Monteiro do Couto